quinta-feira, 19 de maio de 2011

Capítulo 13



16 de Dezembro de 2016
11:12


As cristalinas gotas de água caíam sobre aquele corpo nu, acariciavam livremente a pele morena e suave e acabavam no chão da banheira, juntamente com tudo o que incomodava Tom. Adorava tomar banhos bem quentes e relaxantes, pois podia fazer de conta que todos os seus problemas desapareciam pelo cano abaixo juntamente com a água.
A noite tinha sido do pior, com vários pesadelos que o tinham feito dar voltas e voltas durante o sono, fazendo com que acordasse cheio de dores no corpo todo.
Não lhe apetecia mexer-se. Desejou poder ficar ali durante horas e horas, debaixo do chuveiro, com a pressão da água a massajar-lhe os ombros e as têmporas, quando inclinava a cabeça. O calor que agora inundava toda a casa de banho diminuía a intensidade das dores no peito, onde ainda eram visíveis as nódoas negras, no sítio onde o cinto de segurança o tinha prendido.
Por alguma razão, não estava a conseguir relaxar. Sentia-se preso num dilema, como se estivesse numa encruzilhada – não sabia que caminho seguir.
Devia falar com Lori e confrontá-la com o que Bill lhe tinha contado? Devia procurar Labine e explicar tudo, talvez tentar construir uma nova amizade? Desenterrar o passado seria o melhor passo a dar? Ou seria melhor deixar as coisas correr, criar novas memórias e deixar o passado no passado?
Sentiu uma súbita onda de fúria crescer dentro de si. A raiva começou a correr-lhe nas veias, apoderando-se de todo o seu ser numa questão de segundos. Cerrou os punhos e esmurrou a parede à sua frente, não sentindo qualquer dor graças à ira que o alimentava.
- Porquê eu? – berrou ele, cerrando os olhos com força e cravando as unhas na palma da mão – O que é que eu fiz para merecer isto?
Uma única lágrima desprendeu-se das pestanas dele e escorreu pela cara, misturando-se com a água que o envolvia.


[FLASHBACK]

Tom beijava o pescoço dela enquanto a mão direita explorava cada centímetro da sua pele morena e molhada e a mão esquerda afagava os longos cabelos pretos que pingavam no chão. Empurrou-a suavemente para trás até a encostar à parede e beijou-a com sofreguidão.
A água do chuveiro caía sobre eles, fazendo com que o sangue corresse mais rapidamente junto à pele, potenciando todas as sensações tácteis a que eles próprios se expunham.

[FLASHBACK]


Abriu os olhos quando se apercebeu que acabara de ter uma recordação e não conseguiu evitar sorrir. Não tinha visto a cara da rapariga, mas sabia que era Labine pelo cabelo escuro e pela sensação esquisita na barriga, como se tivesse borboletas a voar dentro de si.
As recordações que lhe apareciam espontaneamente eram cada vez mais frequentes e percebeu que se sentia bem depois de cada uma delas. Sentia-se mais calmo, invadido por uma paz interior que não conseguia explicar. Era estranho, pois há poucos segundos atrás sentia-se completamente enraivecido e injustiçado.
Deixou os braços cair ao longo do corpo, sentindo-se completamente aparvalhado por ter estas variações de humor repentinas. Não era normal nele, que sempre tinha sido muito racional.
Rodou o manípulo da torneira até não cair mais água e saiu da banheira. Pegou na toalha azul pendurada no toalheiro e saiu da casa de banho, onde os vapores quentes que a enchiam tornavam o ar húmido e abafado. Entrou no seu quarto com a toalha na mão, sem se preocupar com o rasto molhado que deixava atrás de si. Pôs-se em frente ao espelho e analisou o seu corpo.
Passou os dedos suavemente pela mancha escura que tinha no peito, que já não lhe doía como antes, mas ainda estava sensível ao toque, apesar de já ter passado quase um mês desde o acidente. Aquela marca era temporária, ia desaparecer com o tempo. Mas seria a falta de memória também temporária?
Sim, ele tinha algumas recordações, mas eram apenas esporádicas e duravam poucos segundos. E aquelas memórias que não voltaria a recordar? Estariam recordações importantes perdidas para sempre?

***

15:05

Olhou de esguelha para a caixa de madeira pousada na sua mesa-de-cabeceira quando foi ao quarto buscar um casaco para vestir. Estava a nevar e Tom queria aproveitar para dar um passeio, como fazia quando era criança. Pena que Bill estivesse a trabalhar nessa tarde… Teria sido bom reviver aquelas guerras de neve que faziam quando nevava em Leipzig, a sua cidade natal. De certeza que iam ter muitas outras oportunidades para o fazer, agora que tinham resolvido o principal problema que os afastara.
Por momentos, ponderou abrir a caixa novamente, ver com mais atenção o que ela continha, talvez tentar recordar partes da sua relação com Lori. Mas de que valia isso se sabia que nunca a iria perdoar pelo que ela tinha feito? O casamento deles tinha acabado no momento em que Tom descobriu aquilo de que Lori era capaz e o golpe baixo que ela tinha aplicado em Labine.
Tom tinha a noção que mais cedo ou mais tarde ia ter que confrontar Lori mas ainda não estava preparado. Precisava de mais tempo para assimilar tudo, pôr as ideias no lugar e preparar-se psicologicamente para o futuro. Não é de ânimo leve que se acaba um casamento, uma vida a dois.
Voltou as costas à caixa e saiu do quarto num passo decidido. Não conseguia lidar com tudo ao mesmo tempo, deixaria aquilo para depois.
Foi para o jardim de sua casa e estendeu a mão enluvada à sua frente, onde pequenos flocos de neve começaram a acumular-se e a derreter por causa do calor que Tom emitia. Não resistiu e começou a construir um pequeno boneco de neve em cima da mesa de jardim, já coberta pelo manto branco.
Riu ao ver o resultado final. Uma cara de pedras, braços de pau, um cachecol vermelho no pescoço e um boné a condizer na cabeça. Algo dentro de si dizia que não se divertia assim há muito tempo.
 
 
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