domingo, 3 de outubro de 2010

Capítulo 1




21 de Novembro de 2016
18:52


- Eu não te percebo, Lori! Nunca estás bem com a vida que tens!
- Eu? Tom, tu é que nunca sabes o que queres!
- Loretta, não me venhas com tretas! – exclamou Tom, indignado – Eu mudei de opinião para te fazer a vontade!
- Loretta? Quando é que deixaste de me tratar por Lori? – perguntou ela, cruzando os braços desafiadoramente.
- Não mudes de conversa, Lori – replicou o Tom, pronunciando o nome dela em tom irónico – Não te interessa o outro tema, não é? Sabes que eu tenho razão.
Tom cruzou os braços e viu-a desviar o olhar para o chão, como se não quisesse continuar a falar. Era o que ela fazia sempre que sabia que estava errada: amuava. Se a discussão não tivesse sido nada de mais, ele ia ter com ela e abraçava-a, fazia-lhe as vontades todas durante umas horas até lhe passar a má disposição. Mas desta vez ele não ia fazer isso porque ela tinha começado uma discussão sem qualquer razão minimamente válida e ele estava farto.
- Tom, estamos a discutir sobre o destino das nossas férias… - Lori adoptou um ar desapontado – Sinceramente, já não me apetece ir a lado nenhum…
- Vês? Vês? Eu queria ir a Nova Iorque, tu querias ir ao Brasil. Eu aceito ir ao Brasil e deixar Nova Iorque para outra vez e tu fazes um escândalo e ainda dizes que já não queres ir a lado nenhum! És fantástica…
Lori não disse mais nada. Sabia que tinha exagerado e suspirou exasperada. Odiava perder disputas sem sentido, como esta. Tom suspirou também e abanou a cabeça lentamente. O casamento dele estava por um fio. Ele e Lori discutiam por qualquer pequena coisa. Sentia-se irritado e nervoso, precisava de espairecer. Levantou-se do sofá onde estava sentado com a sua mulher e dirigiu-se à porta da rua sem olhar para ela. Pegou nas chaves pousadas na mesa de entrada e murmurou “vou dar uma volta” antes de sair.
Entrou no carro cinzento e ligou o motor, mas não arrancou de imediato. Apoiou a cabeça no volante e respirou fundo várias vezes com os olhos fechados. Sempre tinha tido dificuldade em concentrar-se na condução quando estava demasiado agitado e arreliado, mas precisava de sair dali durante umas horas. Precisava de ficar sozinho num sítio calmo e isolado para pensar no seu futuro e no que faria a seguir.


[FLASHBACK]

- Amas-me? – perguntou Lori, olhando-o nos olhos.
Tom pegou nas mãos dela e beijou-as com carinho.
- Amo-te – respondeu ele, devolvendo o olhar dela – E tu? Amas-me?
- Tom, sabes que sim…
Ele sorriu por instantes mas depois tornou-se sério novamente. Abriu e fechou a boca várias vezes até arranjar coragem para falar. A sua mente trabalhava a mil à hora, tentando pensar em algo bonito e romântico para dizer, mas apenas saíram três palavras.
- Queres casar comigo?
Sentiu uma sensação estranha na barriga ao ouvir aquelas palavras sair da sua boca, como se tivessem sido pronunciadas por outra pessoa. Apesar disso, sentiu que era o mais correcto.

[FIM DE FLASHBACK]


Teria sido realmente o mais correcto? Durante os dois anos de namoro, Tom tinha-se sentido no céu, como se caminhasse permanente numa nuvem. O sol brilhava mais, a relva era mais verde e os pássaros cantavam mais alto. No entanto, depois do casamento, tudo parecia diferente. Era como se tivesse descido ao inferno, todos os assuntos eram bons para começar uma nova discussão.
Tom estava perdido em pensamentos e conduzia apenas por instinto, sem rumo definido. Não prestava qualquer atenção ao caminho que estava a tomar e deu por si a percorrer uma estrada secundária estreita e pouco iluminada. Num rasgo de lucidez, deu conta que não fazia a mínima ideia onde estava.
Abrandou a velocidade e fechou os olhos por um segundo. “Que estou eu a fazer?” pensou ele, tentando descodificar o turbilhão de emoções que sentia dentro de si. Estava ansioso por voltar a casa, mas também estava receoso de enfrentar Lori pois não queria discutir novamente.
Quando abriu novamente os olhos, a luz dos faróis de um carro que circulava em sentido oposto ao seu encadeou-o e foi obrigado a semi-cerra-los por alguns instantes.
Foi o suficiente para calcular mal a distância a que se encontrava a curva seguinte. Girou o volante cedo de mais e depois, ao ver que não ia conseguir fazer a curva, atrapalhou-se e foi contra os rails de protecção, destruindo uma parte deles. Desceu a encosta acidentada aos solavancos, sem conseguir travar, porque o carro deslizava na terra e pedras soltas. Só parou quando a frente do carro bateu com força numa árvore, a força do impacto projectando-o para a frente.
A última coisa que sentiu foi uma grande dor de cabeça, como se esta se tivesse partido ao meio, quando bateu com a testa no volante.

***

- Ele está a acordar! – exclamou uma voz feminina, por cima do barulho de um motor e uma sirene.
A sua visão estava desfocada e não soube identificar o sítio onde se encontrava quando olhou debilmente em volta.
Tinha uma máscara de oxigénio no rosto que o ajudava a respirar, embora ainda o fizesse com alguma dificuldade por causa de uma grande dor que tinha no peito. Tentou mexer-se mas uma dor aguda generalizada juntou-se à dor no peito e espalhou-se por todo o seu corpo, fazendo-o soltar um gemido.
- O senhor sofreu um acidente de viação – informou-o a mesma voz feminina – Já lhe demos um medicamento para as dores, não se preocupe porque deve estar quase a fazer efeito.
- Como se chama? – perguntou uma voz masculina vinda do seu lado esquerdo.
- Tom… - respondeu ele, fazendo um grande esforço para falar, a sua voz soando grave e ofegante – Tom Kaulitz.
- Senhor Kaulitz, estamos a caminho do hospital – disse novamente a voz feminina – Quer que nós contactemos alguém em particular?
Tom preparava-se para responder, mas o esforço para falar era demais para si e sentiu-se desfalecer. O ruído do motor, as sirenes da ambulância, as vozes preocupadas dos paramédicos que chamavam em vão por ele, tudo parecia desaparecer. Tudo se transformou em silêncio e escuridão. O seu corpo parecia não existir mais. Sentia-se leve… Sentia-se a flutuar no vazio.
Um choque eléctrico percorreu-o por completo, deixando todas as suas células cheias de energia e trazendo-o de novo à vida.
Deixou-se ficar de olhos fechados, ignorando os pedidos dos paramédicos para que se mantivesse acordado. Sentia-se cansado… Naquele momento, dormir era muito tentador…

***

À sua volta havia um barulho ensurdecedor de pessoas a falar, passos apressados e máquinas a apitar. Abriu os olhos e foi invadido por uma luz ofuscante e brilhante, que o fez fechar de novo os olhos doridos. Estava a ser transportado rapidamente pelos corredores do hospital, tanto quanto conseguia perceber, por varias pessoas.
- Várias costelas partidas, ombro esquerdo deslocado, uma contusão visível na testa e vários ferimentos superficiais na cara e nas mãos. Estava inconsciente quando chegamos ao local do acidente, mas recuperou momentaneamente a consciência para cá. Teve uma paragem cardíaca logo após desfalecer novamente, mas conseguimos estabilizá-lo.
- Façam uma TC e uma ressonância magnética para despistar possíveis hemorragias internas e contactem-me assim que obtiverem os resultados ou se o estado dele se agravar.
Tom tentou abrir novamente os olhos e depois de se habituar minimamente à luz, viu as paredes brancas do hospital a ficarem rapidamente para trás, à medida que avançavam cada vez mais para o interior do edifício. À sua volta, conduziam a maca dois paramédicos e duas enfermeiras, vestidas de branco.
A simples acção de manter os olhos abertos e olhar em volta parecia-lhe um esforço sobre-humano, por isso, voltou a fechá-los.
Um cansaço descomunal apoderou-se dele novamente e voltou a cair num sono profundo.
 
 
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