quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Capítulo 8



14 de Dezembro de 2016
6:40

Tom abriu de novo os olhos e respirou com força, frustrado. Olhou para o relógio digital na mesa-de-cabeceira de Lori e observou os números vermelhos que marcavam 6:40. Ainda não tinha pregado olho desde que se tinha deitado e estava cheio de dores no corpo, de tantas voltas que já tinha dado. Não conseguia estar quieto na cama, não arranjava uma posição suficientemente confortável que o permitisse relaxar e descansar.
O barulho da chuva tinha cessado há algumas horas e agora, tudo era um mar de silêncio lá fora, tal como dentro de casa. Nem os insectos que viviam no bosque que rodeava a vivenda de Tom se atreviam a sair numa noite fria e incerta como aquela.
Deu mais uma volta lenta, praguejando contra as dores no peito, e acendeu a luz do candeeiro. Ficou ali em silêncio durante alguns minutos, fitando um ponto incerto na parede sem saber bem o que fazer.
Não valia a pena continuar a tentar dormir. A noite estava a acabar e ele não queria passar o dia enfiado na cama a dormir. Ligar a televisão não era uma opção viável, uma vez que àquela hora nunca dava nada minimamente interessante. Pelo canto do olho, viu a pequena caixa que Lori lhe tinha dado, pousada na mesa a olhar para si.
Noite de revelações” pensou o Tom, sorrindo para si mesmo. Não sabia o que continha a caixa, mas tinha esperança que o interior misterioso lhe trouxesse algumas lembranças, como as caixas na cave tinham feito.
Levantou-se, vestiu uma camisola quente por cima do pijama, calçou um par de luvas e pegou na caixa. Dirigiu-se à varanda do seu quarto e acendeu a luz, que iluminou um conjunto de duas cadeiras e uma mesa pequena de madeira.
Sentado numa das cadeiras, Tom mantinha a caixa entre as suas mãos, enquanto a observava com cuidado. Era feita de madeira clara e na tampa estava colada uma foto do seu casamento com Lori. Tudo indicava que o conteúdo da caixa estava ligado à sua relação com ela.
Abriu o fecho em forma de flor-de-lis e analisou o recheio. Folhas de papel soltas, um lenço e uma pedra em forma de coração, entre algumas outras coisas aparentemente sem valor.
Pegou na pedra e rolou-a na sua mão. Era de um cinzento clarinho, quase branco, e não era muito pesada.


[FLASHBACK]

Lori estava sentada em cima dele e atacava-o incessantemente com cócegas. Ambos riam com vontade, brincando como duas crianças à sombra de uma árvore frondosa.
- Pára, Lori, pára! – pediu ele por entre gargalhadas – Já não aguento mais…
Ela acedeu e deitou-se ao lado dele, de barriga para cima, ainda a arfar e a tentar conter o riso.
Sentiu algo duro estava a magoar as suas costas e ela levantou a toalha para ver o que era.
- Tom, olha que gira! – exclamou ela, rodando uma pequena pedra clara na mão.
Tom debruçou-se sobre ela para ver e deu-lhe um beijo quando viu que a pedra tinha a forma de um coração.

[FIM DE FLASHBACK]


Sorriu para si próprio ao recordar aquela tarde passada com Lori. O pic-nic à beira rio, a sesta à sombra das árvores… Com um bocadinho de esforço conseguia mesmo ouvir o piar alegre dos pássaros, o som da água a correr, o bater do coração de Lori…
Sentiu uma pontada de dor ao pensar em Lori. Ao relembrar aquela tarde, tinha experimentado tudo novamente, incluindo o amor que um dia sentira por ela. Perguntou-se se ela estaria bem em casa da mãe, se teria chegado bem, se estaria a dormir ou se, como ele, estaria acordada a pensar em momentos idos.
Ela tinha razão. A técnica dos objectos antigos estava a funcionar e a trazer-lhe recordações. Mas trazia também novos sentimentos de insegurança, fragilidade, compaixão, lástima e… saudade.
Guardou todos os objectos de novo na caixa. Eram demasiadas emoções para um dia só. Além disso, o frio começava a ser demasiado intenso e cortante. Conseguia ver a sua respiração como uma nuvem esbranquiçada quando expirava e começava a tremer ligeiramente.
Ao deitar-se de novo na cama, almejou não estar sozinho. “É preciso ter cuidado com o que se deseja” pensou ele ao olhar com melancolia a travesseira de Lori. Podia não sentir por ela o que ela sentia por ele, mas ao menos era uma companhia. Durante dias, desejou estar sozinho e agora só queria tê-la de volta.
Lá fora, as nuvens começaram lentamente a dissipar e o primeiro raio de sol do dia entrou no quarto, iluminando a caixinha de recordações de madeira. No entanto, Tom não o viu. Mantinha os olhos fechados, na esperança de que, quando os abrisse, se deparasse com Lori ao seu lado. Nos lábios vermelhos dela um pequeno sorriso, o cabelo claro espalhado graciosamente pela almofada… O braço dele em volta da cintura dela.
Sem se dar conta que estava a ficar com sono, Tom adormeceu e caiu num sono profundo.
 
 
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